sábado, abril 19, 2008

Parte 3

Hugo – Ótimo.

[Hugo ascende um cigarro]

Hugo – Devo ter bebido muito ontem. Tava precisando. Ultimamente tenho tido dias de cão.

Luíza – E quem não tem tido dias de cão hoje em dia, não é mesmo? Dizem que é mal do século. Sinal dos tempos. Eu particularmente nunca acreditei muito nisso não.

Hugo – Acho que estamos todos vivendo a síndrome de “Último Tango em Paris”.

Luíza – Como assim?

Hugo - Essa coisa meio autodestrutiva de se relacionar com estranhos sem nem ao menos saber seu nome.

Luíza – Mas no filme era Marlon Brando e Maria Schneider, não é meu bem ? Não era um casal qualquer. Ela era bem mais resolvida sexualmente e afetivamente que ele. Logo no início já dá para perceber que ele é uma pessoa bastante atormentada. Além de machista. Obrigar ela a fazer sexo anal. Quase um estupro, assim, como forma de subjugação. Detestaria que alguém fizesse isso comigo.

Hugo – Mesmo que essa pessoa fosse o Marlon Brandon, num apartamento em Paris?

Luíza – Não sei... Num apartamento em Paris, com Brandon. A que se pensar na possibilidade...

Hugo – É, não sou nenhum Marlon Brandon e creio não estarmos em Paris.

Luíza – E eu não nenhuma Maria Schneider. Estamos quites.

Hugo – Ficção é sempre melhor que a realidade. Logo, cinema é meio de escape de uma vida desinteressante. Lembra de Mia Farrow em “A Rosa Púrpura do Cairo”. Assiste ao mesmo filme toda noite como forma de escapar da vida tediosa proporcionada pelo marido canalha viciado em jogatina que a explora descaradamente.

Luíza – É, mas mais cedo ou mais tarde ela teve de enfrentar a sua própria mediocridade cotidiana. Além da quase traição do ator do filme, alvo de sua adoração, que no final acaba por preferir volta à sua “realidade” das telas. Uma excelente metáfora.

Hugo – Mas ficou a lembrança de ruptura com as suas mazelas domésticas, mesmo que de um modo efêmero. Isso por si só vale a pena.

Luíza – Você é um tanto romântico, não?

Hugo – Sou cinéfilo. Gosto de apreciar boas tramas.

Luíza – Essa posição de mero espectador não te incomoda? Quer dizer, é muito cômodo, não participar dos atos de uma peça. Por medo de sofrer, se decepcionar.

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